Entrevista Fernando Peres ("a UNIÃO")
“Fomos impedidos de ganhar o campeonato…”
Depois de uma época em que as coisas não correram da melhor forma para a sua equipa (vice-campeã nos Açores e no nacional de Produção, embora aqui com a vitória de José Pedro Silva nos navegadores…), o futuro está em aberto para Fernando Peres. Foi nas instalações da equipa familiar, a “Peres Competições” – onde, entre vários EVO de diferentes gerações, repousam máquinas como o Escort RS Mk1 “Diabolique”, algumas “barchettas” clássicas, um Escort Cosworth e mais algumas preciosidades…- que tivemos oportunidade de falar com um homem que se afirma “sentido” pelas atitudes impensadas que “alteraram a verdade desportiva” no último “Açoriano” de ralis. Sem papas na língua, Peres foi peremptório nas declarações, depois de mostrar os pneus afectados por “supostas” armadilhas…
Entrevista: Miguel de Sousa Azevedo (no Porto).
Fotos: Ricardo Laureano e porto das pipas PRESS.
“a UNIÃO” – Em 2008 o objectivo de mais um título nos Açores não foi conseguido. Uma série inicial de azares culminou com o segundo lugar da tabela…
Fernando Peres – Ganhámos as duas primeiras provas, depois no Faial um problema com o turbo impediu-nos de lutar pela vitória. No SATA fizemos um grande rali, onde novamente houve azares mecânicos, e depois em Santa Maria acho que o resultado e a actuação falam por si. Na Terceira e no Lagoa, muito sinceramente, penso que fomos impedidos, não sei por quem mas tenho a noção de que houve factores externos ao andamento em causa, de vencer ambas as provas, ou de, pelo menos, discutir as vitórias normalmente. Acho que fomos a equipa mais rápida e, conforme já tinha declarado, provavelmente teríamos sido campeões sem os furos sofridos nas últimas duas provas. Recordo que, num único rali (Lagoa), tivemos mais furos que em cinco anos de ralis nos Açores, pois furámos quatro vezes, sem nunca tocar nas bermas, até porque conheço muito bem aqueles troços, e sem danos laterais em qualquer dos pneus, conforme já te mostrei…(ndr-Antes da entrevista Fernando Peres mostrou-nos quatro dos pneus afectados pelos furos nos ralis Ilha Lilás e Lagoa).
“aU” – Em termos de andamento pode dizer-se que mantiveram a supremacia. Está confirmada a presença em 2009?
F.P. – Não está. Não sei ainda o que se vai passar, mas estamos em conversações com o nosso patrocinador para, dentro em breve, poder divulgar o que vamos fazer. Também o ano passado as coisas só ficaram decididas em cima da hora, por isso estamos a aguardar
“aU” – O resumo do campeonato ficou então associado à polémica relativa aos furos sofridos nas duas últimas provas…
F.P. – Conforme disse tenho a noção de que houve quem nos tenha querido prejudicar e não me tiram facilmente isso da ideia. Estava em jogo um prémio de 100 mil euros e, infelizmente, acredito que os males de outros desportos – conforme eu já vinha avisando há alguns anos – chegaram aos ralis. Tenho pena que assim seja, mas mantenho a postura que sempre tive neste desporto, apenas lamentando que dentro dos troços não tenham sido apenas os tempos e o andamento a decidir as provas…
“aU” – Já há resultados das perícias anunciadas aos pneus furados?
F.P. – Estou à espera da comunicação oficial do representante em Portugal da Michelin (BF Goodrich), que é quem nos fornece os pneus, para depois fazer eu um comunicado sobre o assunto, mas tenho a firme presença de espírito para assegurar que não foram furos normais. Tratam-se de pneus da última geração, que andam em pisos duríssimos sem nunca sofrer danos, pelo que visivelmente tenho as minhas reservas sobre o sucedido.
“aU” – Como vês a evolução do campeonato açoriano de 2004 até agora?
F.P. – Acho que foi notória em todos os aspectos. No número de participantes, no interesse das disputas e na qualidade dos carros intervenientes nas principais lutas. Já pude ver reportagens de anos anteriores em que pude comprovar que, antigamente, os campeonatos eram praticamente ganhos à partida por um ou outro piloto mais bem equipado. Realço que a grande dependência face ao patrocínio das tabaqueiras pode pôr em cheque a realidade regional, até porque não estou a ver que alternativas possam surgir no caso desses apoios, um dia, poderem falhar…
“aU” – O “factor” SATA Rali Açores continua a ser preponderante na visibilidade da modalidade na região. Como pode ser analisada a recente entrada no IRC?
F.P. – Só consigo compreender a entrada do SATA no IRC se for acompanhada de uma aposta forte da região no rali. Há qualquer coisa que não “joga” bem quando continuamos a ver as estradas míticas da prova, as poucas que restam, a sofrer do mesmo mal das anteriores: o asfaltamento. Essa realidade vai desvirtuar para sempre aquela que foi uma prova de referência, atendendo a que se quer organizar uma prova com qualidade. Dou um exemplo próximo que é o troço Lomba da Maia/Achada das Furnas, sem o qual não vejo como se poderá montar um rali com as características do actual SATA. Tudo pela questão fulcral da localização daquele percurso e porque penso que não faz sentido haver ali uma estrada asfaltada. Ainda há uns tempos estivemos parados no antigo troço de Monte Escuro, agora asfaltado, e não passa lá ninguém, enquanto há ligações diárias que fazemos com estradas de asfalto que estão degradadas, e isso não faz sentido…
Além disso não percebo que não haja uma “rota verde” na ilha de São Miguel que “venda” a imagem das estradas de terra e caminhos secundários, que são excelentes, correndo-se o risco deles desaparecerem. E veja-se a reabilitação da Tronqueira, esse sim um exemplo positivo para o que refiro.
“aU” – Em termos nacionais, e depois da perda do título na Produção, a nova época afigura-se como de oportunidades absolutas para os privados?
F.P. – Estamos numa altura de crise, sendo que a do campeonato português já se anunciava há muito. Tirando o título absoluto, e aí sim as coisas são diferentes, não me faz grande diferença ter mais este ou aquele título secundário. Depois de ser campeão nacional três vezes é difícil que os desafios inferiores ganhem importância similar.
“aU” – Sendo que integras uma estrutura competitiva de relevo em Portugal, também ao nível da entrega e da predisposição pessoal os ralis estão em alta?
F.P. – Não sei ainda o que vou fazer este ano, sendo que os esforços envidados são para fazer o campeonato nacional, onde acredito que ainda somos capazes de vencer. Mas, neste momento, está tudo a ser equacionado, embora ainda sem respostas concretas.
“aU” - És dos mais experientes pilotos do pelotão nacional. Em que se vai reflectindo esse factor na preparação e na abordagem das provas?
F.P. – É evidente que a experiência conta muito nos ralis, mas também sei que não alinho nas provas à espera dos azares dos outros para poder ganhar. Sei que ainda sou competitivo e que o conjunto, onde mesmo com menos coração há, de facto, mais experiência, está apto para vencer. Se um dia deixar de sentir isso, passo para um campeonato inferior e corro com outras aspirações. É simples.
“aU” – Como acompanhas a ascensão dos novos valores, tanto a nível regional como nacional?
F.P. – Não tem sido seguida uma política de apoio aos novos valores. Os ralis portugueses precisam de ser repensados, pois foram dados passos que encarecem as provas, quando se deveria enveredar pelo caminho inverso. Lembro que, no final de 2007, houve quem falasse num S2000 para corrermos nos Açores, uma possibilidade em que nunca sequer pensei dados os custos dessa opção e o que ela iria significar em termos de desigualdade nas lutas. Tem de haver uma forma de travar essa subida louca de custos e, em Portugal, fomos a reboque de uma aposta da Federação Internacional (FIA) que visou apenas beneficiar os construtores europeus, nomeadamente com o aparecimento dos S2000, que resultam tão só da falta de capacidade dos europeus se equivalerem ao nível da construção de carros fiáveis de série, e muito mais baratos, como são os japoneses, neste caso Mitsubishi e Subaru.
“aU” – Que futuro auguras para os ralis nacionais, face ao momento económico e às actuais regulamentações?
F.P. – Repito que mesmo sem a crise económica teríamos uma crise no campeonato português, onde as coisas foram sempre orientadas no sentido de beneficiar o envolvimento das marcas. Se elas abandonam, como é o caso actual, ficamos sem saber o que fazer, quando as alternativas deveriam estar pensadas, valorizando as equipas privadas.
“aU” – Pensas que está sanado algum mal estar que a tua entrada no campeonato açoriano (2004) tenha causado, isto dados os factos que a originaram?
F.P. – Acho que fui apanhado no meio de uma “guerra” a que eu não pertencia, ainda mais porque, nesse ano, o campeonato começou na Terceira, cujo principal piloto – o Gustavo – travava um diferendo com o seu anterior patrocinador – a Fábrica de Tabaco Estrela - que, então, tinha levado à apreensão do carro de corridas. Havia, de facto, uma pressão terrível e que me lembro de sentir, mas que se diluiu nas provas seguintes. Pontualmente pode ter havido algumas coisas, mas, e até estas últimas provas, não me lembro de sentir nada semelhante, sendo que acho natural que as pessoas da sua terra queiram que os pilotos locais ganhem. Agora há situações que não são normais e eu estou sentido com algumas delas, casos de uma polémica em torno da minha carta de condução num rali na Terceira, depois da nossa exclusão de uma prova, também na Terceira, que viria a ser corrigida em Lisboa, ou até das declarações de um advogado de um piloto, no caso o “Licas” Pimentel, falando de um “lobbie” nos Açores para que eu ganhasse o campeonato e por aí fora. Sei que há um conjunto de pessoas que, até hoje, tudo fizeram para que eu não ganhasse um único campeonato na região…
“aU” – Qual o rali que mais gostaste de disputar nos Açores?
F.P. – O rali do Faial (Ilha Azul).
“aU” – É famoso o vosso video on-board (You Tube) com o recorde da Fonte Faneca/Veredas (2006). Há também alguma classificativa preferida?
F.P. – Até nesse vídeo se pode comprovar que sempre corremos de uma maneira aberta, pois as nossas notas do troço estão à disposição de todos mas, e relativamente aos troços, acho que não há um em particular, com a excepção a poder ser o troço do Vulcão dos Capelinhos que, inclusivamente, me leva a preferir o rali a que pertence. Mas gosto de troços em todas as ilhas onde corremos e realço, na Terceira, a zona onde fazemos o shakedown, que é excelente, embora destaque a generalidade dos troços e o grande gosto dos adeptos locais como a imagem de um campeonato com muita diversidade e que gosto de disputar.
“aU” – Passadas quase duas décadas e meia de carreira, os ralis continuam a ser o melhor desporto do mundo?
F.P. – Continuam a ser o meu desporto de eleição. No dia em que deixar de ser competitivo passo a fazer outro campeonato, caso do Open de ralis, pois vou querer sempre correr ao fim-de-semana…
“aU” – Quais são, sinceramente, os desejos desportivos para 2009?
F.P. – Desejo que não se repitam alguns dos factos do ano transacto e que os ralis se decidam dentro dos troços, em condições normais, e sem furos. Aliás, antes do último rali da Lagoa, esse foi um dos desejos que formulei, infelizmente as coisas não correram assim e foi o que se viu. De uma maneira franca sei que os factos passados, e repito que não sei quem atentou de forma grave contra nós, apenas tiveram lugar porque havia um prémio de 100 mil euros em jogo e porque era um continental que estava a correr na região. Repetiu-se o que já se sucedera num Nacional com o Joaquim Moutinho e espero, sinceramente, que tal não volte a acontecer.
Fonte:Motoresmagazine.net
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